Diretor da SNA propõe ações para recuperar o setor de cana

Mesmo com a continuidade da produção nas usinas e com o esmagamento da cana, o diretor da SNA, Marcos Fava Neves afirma que “o etanol não está sendo vendido, o estoque aumenta e não há renda”. Foto: Pixabay

O setor sucroalcooleiro é um dos mais afetados, na cadeia do agro, pela guerra dos preços do petróleo e pelo impacto do novo Coronavírus. Diante desse quadro,  o diretor da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) e professor da USP/Ribeirão Preto, Marcos Fava Neves, defendeu a adoção de algumas medidas, em alinhamento com as propostas do Ministério da Agricultura e de lideranças do meio rural, que poderão melhorar o atual cenário.

Segundo ele, as ações tem caráter de urgência. “Precisamos de dinheiro para fazer o fluxo de caixa das usinas, para que os fornecedores sejam pagos e a atividade continue. Temos também de tirar o PIS/Cofins do etanol , espero que de maneira definitiva, por seu benefício ambiental e também por seu caráter de promoção de emprego e interiorização do desenvolvimento”, ressalta o diretor da SNA.

Além disso, ele defende a elevação temporária da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) na gasolina, “até porque o governo precisa arrecadar recursos para setores como segurança e educação”. Com isso, diz Neves, “conseguiremos aumentar a participação do etanol nessa retomada, esvaziar os tanques e normalizar um pouco a situação”.

O professor da USP reforça que é necessário “adotar medidas emergenciais e bem pensadas, porque a safra de cana está começando, há uma queda drástica do consumo de etanol devido à política de isolamento de pessoas e a gasolina também está em queda por causa do preço do petróleo”. Estes fatos, para Neves, provocam um ‘efeito dominó’, derrubando os preços do açúcar e as perspectivas para o setor de cana.

“Essas medidas são factíveis, não representam subsídios do governo e vão permitir que o setor de cana, que é fundamental, receba um pouco de ajuda”, complementa o especialista, acrescentando que seria oportuno “pensar também no aumento mínimo da presença de anidro na gasolina, de maneira pontual e temporária, caso seja necessário”.

Custos de produção

Neves chamou a atenção para o fato de que, mesmo com a continuidade da produção nas usinas e com o esmagamento da cana, o etanol não está sendo vendido, o estoque aumenta e não há renda.

“A produção de cana é uma atividade que requer investimentos pelo período de dois anos e só há resultados a partir da venda do açúcar e do etanol. Nesse momento em que é preciso ter caixa pra fazer frente às despesas, não há receita devido à queda drástica do consumo de etanol em março e que continua em abril”, ressalta o diretor da SNA.

Ele lembra ainda que o setor está tomando os devidos cuidados em relação à contaminação pelo Coronavírus. “Isso eleva os custos de produção, pois há menos gente fazendo o transporte e surge a necessidade de fornecer equipamentos (para prevenir a doença). Esse problema operacional complica o cotidiano dos trabalhadores”.

Dívidas

Quanto à situação das usinas, Neves afirma ser difícil prever quantas unidades poderão quebrar com a crise, pois, para ele, isso depende das medidas que serão tomadas para reverter esse quadro.

“Se há grupos altamente endividados, eles irão afundar mais ainda, pois serão obrigados a vender esse etanol com desconto, provavelmente para grupos capitalizados, e vão precisar captar recursos a um custo elevado, pois as taxas de juros caíram, mas o crédito sumiu, porque está todo mundo com medo”.

Segundo o especialista, praticamente 1/3 do setor está endividado. “Depois da crise, poderemos ver grupos capitalizados absorvendo unidades industriais de grupos que não conseguiram sobreviver a esse abalo”.

Açúcar

Com relação ao açúcar, o diretor da SNA  acredita que a preocupação não é tão grande. “As usinas e o setor de cana foram muito hábeis em fixar os preços da commodity. Eles conseguiram vender de 80% a 85% do açúcar que será exportado nesse ciclo que começou em primeiro de abril a um preço médio de R$ 1.300,00 a tonelada, que é um valor razoável. No mercado interno, o preço também está bom”.

O problema, segundo Neves, é que, “se o setor de etanol ficar muito ruim, as usinas vão desviar a cana para fazer mais açúcar, e vão derrubar o preço do produto”. Por isso, diz ele, “temos de recuperar logo o etanol, para que o açúcar fique com um bom preço no próximo ano. A commodity foi muito ajudada pelo câmbio a R$ 5,00”.

Retomada

Mesmo no atual contexto, Neves não desconsidera uma possível retomada para os próximos meses.”Se a gente sair dessa crise em breve, retomando as atividades e o consumo em maio ou junho, o setor ainda consegue se recuperar. Vai depender dessa questão do isolamento. E precisamos ser cirúrgicos na recomendação de ajuda para que possamos atravessar essa fase”.

“Por outro lado, existe a possibilidade de a economia voltar no segundo semestre, e com muita força, para compensar esse momento de crise”, observa o professor da USP, complementando que “na China, as lojas foram abertas e os consumidores, talvez por ‘vingança’, provocaram um recorde nas compras”.

Além disso, Neves destaca o potencial do Brasil para atender a demanda por alimentos de países que estão enfrentando problemas de desabastecimento, devido ao impacto do Coronavírus. “Mesmo depois da crise, o País poderá suprir essa demanda de forma permanente”.

Perspectivas de crescimento

Apesar da crise, o diretor da SNA afirma que as perspectivas para o agro são de crescimento do PIB entre 1% a 2%, e acrescenta que a renda agrícola deverá superar os R$ 700 bilhões.

“Teremos uma safra recorde. Mais uma vez, o agro está levantando o Brasil. Com isso, espera-se que a sociedade tenha mais respeito pelos produtores rurais que, mesmo com a crise, não estão deixando de abastecer, continuam a trabalhar apesar dos riscos, e ainda vão entregar uma safra recorde, garantindo a entrada de dólares com as exportações no segundo semestre”, enfatiza Neves.

Para ele, é preciso que o Brasil saia da crise “com a perspectiva de agro soberania”. “Temos de trabalhar com inteligência e criatividade para que, daqui a cinco a dez anos, possamos agregar mais valor ao Brasil, possibilitando uma expansão sustentável do setor e posicionando o País como grande fornecedor mundial de alimentos, respeitado, mas que dita as regras do jogo e coordena as vendas.

“Esse é o pensamento que deverá emergir de tudo o que está acontecendo neste momento”, conclui, lançando um desafio para o setor cooperativista.

“É preciso centralizar os sistemas de cooperativas em uma estrutura comercial conjunta, como forma de evitar disputas de empresas nos mercados externos e promover o trabalho coletivo. Isso fará com que sejamos vendedores confiáveis e soberanos. As cooperativas poderão ser protagonistas deste novo Brasil que virá após o vírus”.

 

Fontes: Dr.Agro/Notícias Agrícolas

Equipe SNA

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