Em crise, CGG Trading renegocia suas dívidas

Constituída há seis anos como uma alternativa ao produtor brasileiro para a comercialização de grãos, em contraponto ao domínio de grandes multinacionais nesse setor, a CGG Trading registrou em 2016 uma deterioração brutal de sua situação financeira, chegando à beira da insolvência.

Diante dos resultados ruins, as operações de compra e venda de matérias-primas foram praticamente paralisadas no meio do ano por decisão do conselho de acionistas. Com isso, os estoques minguaram para apenas 877 toneladas (eram 52.000 toneladas em dezembro de 2015), o caixa final caiu para a metade, encerrando o ano em US$ 12.5 milhões, e o patrimônio líquido da companhia se aproximou de US$ 10 milhões negativos ao fim do ano fiscal. Ou seja: ainda que vendesse todos os ativos, a CGG continuaria devedora.

A derrocada dos números no exercício passado, aos quais o Valor teve acesso, pega no contrapé os planos da japonesa Sojitz no Brasil, que em 2014 entrou na estrutura societária da CGG Trading com 43,13% do capital, e ambições de avançar sua participação para o controle ou a totalidade das ações. É também um revés para Josué Gomes da Silva, dono da Coteminas, em sua estreia no agronegócio brasileiro. O empresário foi um dos mentores e fundadores da Cantagalo General Grains, holding sob a qual estão a CGG Trading, fazendas agrícolas e ativos logísticos, sendo a Coteminas a acionista majoritária (ver quadro).

“Basicamente paramos de operar”, disse Gomes da Silva em entrevista exclusiva ao Valor. “Depois de olhar os números do primeiro trimestre, o conselho decidiu zerar os livros até termos condições de recomeçar. A melhor forma de sair de um buraco é parar de cavar”.

Assim como as demais empresas do setor, a CGG explica que sofreu com as disfunções climáticas que levaram à maior seca em décadas no Centro-Oeste e em Matopiba, onde a trading tem os maiores negócios de originação. Mas outras razões de fundo, como problemas de gestão e governança, ajudam a explicar a atual situação da empresa, admitiu o empresário.

A deterioração financeira da trading, até então limitada a especulações de mercado, ganhou contornos oficiais na semana passada com a divulgação do resultado financeiro global da Sojitz, em que a companhia alertava para perdas no Brasil associadas às operações da CGG e um prejuízo resultante de 14 bilhões de ienes (US$ 123 milhões) no país. A mesma nota explicativa afirmava que a CGG encontrava-se em “insolvência” (a Sojitz afirmou ter se equivocado com o termo, já que o documento original em japonês falava de uma “preocupação com o excesso de dívidas de curto prazo”, tradução validada por tradutores juramentados consultados pelo Valor).

Apesar dos problemas, Josué Gomes da Silva reiterou que a CGG ainda não está quebrada. Ele disse que algumas medidas estão sendo tomadas na tentativa de reativar a empresa, da qual ele já não esconde querer sair no momento oportuno. “A tendência é que a Coteminas saia em algum momento. Não é o nosso ramo e todos sabem. O meu negócio é isso daqui [Coteminas], que já dá um bocado de trabalho, e também um pouco de política”.

A primeira medida foi a troca completa do alto comando da companhia em dezembro, quando o jogo não poderia mais ser virado em 2016. O novo time, comandado por Brandon Scott, recebeu como primeira tarefa o reperfilamento das dívidas de curto prazo com oito bancos. Concluída em abril, a negociação estendeu os pagamentos em três anos e a um custo médio mais baixo, dando algum fôlego extra para continuar.

Outra decisão foi a mudança radical na estratégia do negócio, com um encolhimento expressivo nas áreas e pretensões de atuação. A avaliação atual dos acionistas é de que houve um erro estratégico em entrar na disputa por mercado com ADM, Bunge, Cargill e Luis Dreyfus. “Diferentemente de antes, não há mais o propósito de competir por grandes volumes. A rigor, nós não temos nem sistema para isso”, afirmou. Segundo ele, o foco irá para mercados de “nicho” com mais valor agregado, sem explicar o que isso seria.

Neste novo contexto, a CGG Trading também colocou à venda a sua participação no Terminal de Grãos do Maranhão (Tegram), o negócio é de longe o mais atraente do portfólio da companhia. O terminal, que movimenta soja, farelo e milho, já começou a ser oferecido ao mercado pelo banco ABN Amro, “sem pressa”, disse uma fonte, “para sair da posição ao longo dos próximos três anos”, quando as dívidas voltam a vencer novamente.

Manter o ovo de ouro já não faz mais sentido, segundo Gomes da Silva. “Se fosse a visão anterior, de vender grandes volumes e de ser quase uma rival das grandes tradings, ter um ativo logístico tão estratégico como o Tegram seria fundamental. A visão agora é completamente diferente. As fazendas são ativos muito mais estratégicos dentro desse novo cenário”, disse.

Em seu último resultado financeiro, a CGG apresentou, a título de informação, o valor justo do terminal em US$ 161.3 milhões ou US$ 77,7 milhões a mais que o valor contábil do ativo. Se a empresa pudesse registrar esse efeito, o que lei brasileira proíbe, seu patrimônio passaria dos US$ 10 milhões negativos para US$ 67.7 milhões positivos. A intenção é apresentar aos credores uma posição mais próxima (e positiva) da realidade.

Josué Gomes da Silva decidiu colocar o pé no agronegócio após receber o pagamento em fazendas em financiamentos que fazia a produtores de algodão, a Coteminas é um grande consumidor nacional da fibra. Em 2011, formalizou a parceria com dois investidores do agronegócio, Vilson Vian, da GFN Agrícola, e Paulo Garcez, da Agrícola Estreito, e depois com o fundo americano Valor Grains. A Sojitz foi a última a entrar na sociedade, com 5% na holding.

Questionado sobre o que aprendeu nessa experiência, o empresário disse que, como qualquer setor, o agronegócio exige experiência e conhecimento. “Quando houve um problema [climático] que quebrou a safra de milho, nós não conseguimos ler antecipadamente o tamanho do problema”, admitiu.

 

Fonte: Valor

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