Especialistas analisam correlação entre gestão hídrica, energia elétrica e futuro do agro no Brasil

“Sem água, fertilizantes e energia elétrica, não há produção competitiva de alimentos. O Brasil tem todas as características e recursos para se tornar uma potência energética e alimentar produtora de grande quantidade de créditos de carbono/metano, podendo ser exemplo de economia circular para o mundo”. De acordo com os especialistas em energia, Adriano Pires e Bruno Pascon, em artigo escrito para o site Poder 360, existe uma estreita correlação entre questões ambientais, eficiência energética e produção agropecuária. Na visão da dupla, essa lição foi evidenciada ao mundo pela ruptura no abastecimento de grãos, fertilizantes e de gás provocados pela guerra na Ucrânia, e o Brasil precisa aprender com o exemplo externo e investir em algumas questões primordiais para se consolidar como protagonista da segurança alimentar mundial. Atualmente, o Brasil responde por 20% do abastecimento da população mundial e, de acordo com cálculos da ONU, o Brasil vai alimentar 40% da população do planeta estimada em atingir o número de 9,6 bilhões de pessoas até 2050.

A dupla lembra que, “de 1998 a 2022, a União Europeia dependeu da Rússia para abastecer 40%-55% de seu mercado consumidor de gás natural. A guerra mostrou, também, algo que o mundo não estava prestando atenção: Rússia, Ucrânia e Belarus são responsáveis por 33% da produção de fertilizantes global. Sem eles, a agricultura moderna não é capaz de produzir alimentos suficientes a preços competitivos sem a expansão da fronteira agrícola para novas áreas”.

Para que o Brasil seja mais autossuficiente, mais diversificado e corresponda à expectativa de celeiro do mundo, os especialistas preveem algumas atitudes importantes. A primeira das ações visaria a preservação dos recursos hídricos brasileiros garantindo água para a produção atual e o consumo das gerações futuras. Hoje a geração hidrelétrica corresponde a 12,8% do uso da água e a irrigação, a 79,2%. “Precisamos irrigar cada vez mais, e, mesmo criar um plano nacional de irrigação e para termos sucesso é necessário aumentar e muito a geração de energia, através de matriz elétrica mais diversificada. Para isso, temos de promover investimentos em tecnologia e digitalização do agronegócio e iniciativas de reciclagem e de economia circular que possam reaproveitar os recursos, bem como produzir energia elétrica e biocombustíveis a partir de resíduos de uma ampla gama de processos industriais e agrossilvopastoris”, apontam.

A segunda das medidas destacada é a interiorização da oferta de gás natural. Na perspectiva dos especialistas, a interiorização vai criar condições para a revitalização das bacias hidrográficas, gerar empregos, impactar na descarbonização do agronegócio, permitir a redução dos níveis de reinjeção de gás natural na bacia do pré-sal e “iniciar um ciclo que vai transformar o país em exportador líquido de gás natural, assim como já o é no caso de petróleo”

A ampliação do uso de gás natural e a possível posição de exportador também impactariam fortemente o agronegócio na visão de Pires e Pascon por criarem a possibilidade de produção de fertilizantes nitrogenados interrompendo a dependência externa do agronegócio brasileiro em relação aos fertilizantes. No momento, a produção interna do produto não corresponde à demanda de consumo para produção agropecuária sendo necessária a importação de 85% de fertilizantes para suprir as necessidades do mercado doméstico. “Com gás natural e biogás competitivos, o Brasil poderá cumprir os objetivos do Plano Nacional de Fertilizantes. Representaria um aumento de 7,85 vezes na produção doméstica até 2050, alcançando por volta de 58 a 60 milhões de toneladas por ano –atualmente, são de 7 a 8 milhões”, resumem.

Esse cenário futuro planejado pelos autores do artigo se apoia na aprovação pelo Congresso Nacional da Lei 14.182/21 que dispõe sobre a desestatização da empresa Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras) e em outras políticas públicas. “É fundamental que a análise inclua um conjunto de outras políticas públicas: 1) o Projeto Poço Transparente de retomada de desenvolvimento de recursos não convencionais de petróleo e gás no Brasil (Resolução CNPE 28/2021); 2) o Plano Nacional de Fertilizantes (PNF) publicado em 11 de Março de 2022 (Decreto #10.991/22); 3) as medidas de incentivo ao biometano anunciadas em 21 de março de 2022, bem como decreto criando créditos de metano de 19 de maio de 2022 (11.075) no sistema Sinares; e 4) o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), de 13 de abril de 2022, que introduziu meta de encerramento dos lixões do país (Decreto 11.043/22).

“Muitos vão se surpreender com a demanda de energia reprimida que vai aparecer com o processo de interiorização de infraestrutura de gás natural e soluções logísticas multimodais, desconcentrando as alternativas de fluxo de bens, mercadorias e pessoas em todo o país”, completam.

Por Equipe SNA
Fonte: Artigo publicado no site Poder 360 escrito por Adriano Pires, doutor em economia industrial pela Universidade Paris 13 (1987), mestre em planejamento energético pela Coppe/UFRJ (1983) e economista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1980) e Bruno Pascon, bacharel em Administração de Empresas pela Eaesp-FGV (2005), analista responsável pela cobertura dos setores elétrico e de óleo & gás para a América Latina em diversos bancos de investimento (Citigroup, Barclays Capital e Goldman Sachs)
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