Especialistas concordam sobre menos investimento na soja e divergem sobre redução da área

Embora todo o mercado de soja e milho estejam atentos, bem como os produtores brasileiros, à nova safra de grãos dos Estados Unidos, o planejamento da temporada 2023/24 vai ganhando cada vez mais espaço no dia a dia aqui no Brasil. Com os preços muito pressionados, registrando os seus menores níveis em pelo menos três anos, as estratégias de investimentos estão sendo repensadas.

Analistas e consultores registram custos de produção consideravelmente menores em relação à temporada 2022/23, em especial pela queda nos preços dos químicos e fertilizantes, os quais registraram patamares historicamente elevados no último ano. Todavia, o quadro pode ser insuficiente para estimular o sojicultor brasileiro a aumentar a sua área ou até mesmo mantê-la.

Os últimos números do IMEA (Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária) apontaram para uma queda de 5,70% no Custo Operacional Efetivo (COE) da safra 2023/24 em relação à anterior. “A maior queda veio do custeio, que caiu 12,91% em relação a safra 2022/23, pressionada pelo recuo nos fertilizantes e corretivos (- 21,28%) e sementes (- 20,51%). Esse cenário é reflexo da desvalorização dos preços dos insumos nos últimos meses, devido à menor demanda, cenário de oferta mais otimista no mercado externo e ao recuo mensal do dólar”, informou o IMEA.

No mesmo relatório, porém, o IMEA também indicou que a queda contínua das cotações da soja acaba estreitando o ponto de equilíbrio da atividade, levando-o para R$ 109,83 por saca, 8,47% a mais do que na safra passada, no último levantamento até 19 de maio.

O cenário é semelhante em outros estados produtores e, por conta disso, algumas consultorias já estimam que o Brasil poderia registrar uma redução de área nesta próxima temporada, pela primeira vez em desde a safra 2000/01. O gráfico da Pátria Agronegócios mostra esse movimento.

Nos últimos 23 anos, a área brasileira plantada de soja veio registrando crescimento safra a safra, com exceção da transição de 2004/05 para 2005/06 e de 2005/06 para 2006/07, quando reduções de 2,40% e 9,10%, respectivamente, foram registradas. Assim, pela primeira vez em 17 anos, uma nova queda pode acontecer, depois de um aumento de 5,60% da 2021/22 para 2022/23.

“Temos que começar a pensar na sobrevivência de 2024. Um ano recheado de incertezas, com capacidade de grandes produções, mas também com capacidade de catástrofes produtivas, vamos depender dessa base fundamental que é completamente imprevisível. Então, pensar um pouco hoje na sobrevivência é importante. Temos sim uma soja muito desvalorizada. São os menores patamares em três anos. Já temos soja da safra atual e da de 2024 sendo ofertada abaixo dos R$ 100,00 por saca”, disse o diretor da Pátria Agronegócios, Matheus Pereira.

O especialista complementa afirmando que o “pensar na sobrevivência” é pensar nos custos. O momento é ainda de possibilidade de construção de custos de produção e de margens, mesmo que bem mais baixas do que nos últimos anos, destacando as baixas nos fertilizantes e químicos. “A construção dos custos agora também está em queda, assim como a soja, vale a pena o produtor fazer o dever de casa e suas contas e ver o que realmente está compensando para o próximo ciclo”.

No período de 1º de junho de 2022 a 1º de junho de 2023, os preços de referência do MAP, por exemplo, caíram de US$ 1.075,00 para US$ 460,00 por tonelada, uma queda acumulada de 57%, segundo o acompanhamento feito pelo analista de fertilizantes da Agrinvest Commodities, Jeferson Souza. Somente entre as duas últimas semanas de maio e o início de junho, a queda foi de 10%.

Comportamento dos preços do MAP – Gráfico: Jeferson Souza/Agrinvest Commodities

Para Luiz Fernando Gutierrez, analista da Safras & Mercado, a redução de área é pouco provável e o mínimo esperado é uma manutenção. “Em alguns estados, mesmo com a queda da margem, os produtores não vão deixar de plantar. O que pode acontecer é diminuirmos o ritmo de crescimento de área no Brasil, mas redução, muito difícil Pelo menos é o que temos hoje”.

Em julho, a Safras & Mercado divulgará os seus primeiros números de estimativas de área de plantio da safra 2023/24 do Brasil.

A opinião é compartilhada pelo Diretor-Geral do Grupo Labhoro, Ginaldo Sousa. O executivo também espera que ao menos mantida a área cultivada com soja seja no Brasil, diante da necessidade que o produtor tem de plantar e mesmo a custos que, embora estejam caindo, ainda são considerados elevados pelo sojicultor frente a preços tão baixos como os atualmente praticados para a oleaginosa brasileira.

No entanto, Sousa faz um alerta. “Não deverá ocorrer um grande aumento de área, mas a safra do ano que vem não deverá ter a mesma qualidade de plantio, o mesmo investimento em tecnologia, os mesmos insumos. E os investimentos não serão menores em tecnologia só na soja, mas também no milho.

O Diretor da Labhoro afirma que a tendência é de que os produtores aguardem um pouco mais para tomar suas decisões sobre a nova temporada, na medida em que a nova safra americana mostrar mais clareza. Afinal, as lavouras dos EUA estão apenas em fase inicial de desenvolvimento e, apesar de um começo bom com o plantio, há ainda muitas incertezas. As chuvas esperadas para junho e julho devem não só se confirmar como melhorar ou os preços podem reagir um pouco mais em Chicago.

Assim, “podemos não ter redução de área no Brasil se tivermos um clima ruim nos Estados Unidos”, disse. Sousa explica ainda que os campos americanos não contam com uma reserva hídrica e precisam destas precipitações se confirmando nos próximos meses e que a definição deste cenário será determinante para a direção das cotações em Chicago, e consequentemente, para os indicativos no Brasil.

“Se as chuvas falharem agora, nestes próximos meses, os vencimentos mais longos podem subir bastante e os produtores encontrarem preços melhores, inclusive para a safra nova”, disse. E disse também que há tempo ainda para que os produtores brasileiros tracem estratégias eficientes o bastante que lhes garanta margens saudáveis, mesmo que bastante ajustadas.

Soja ou milho?

Não bastassem as surpresas e incertezas que já marcam a nem ao menos iniciada safra 2023/24, o produtor brasileiro ainda deverá enfrentar mais um dilema: soja ou milho? A resposta para esta pergunta não só é complexa, mas é variável e particular dependendo não só da região onde está o produtor, como também seu planejamento de caixa e sua capitalização.

“Vamos ter um grande volume de milho agora, Chicago com a safra americana registrando uma produtividade entre 180 e 181,5 bushels por acre (como estimou o USDA em seu último reporte) nos US$ 5,30 é um Chicago elevado. Então, a tendência do milho é cair, como a da soja também é cair. Se o produtor brasileiro for plantar milho verão, vai começar a colher no início de fevereiro, período em que já devemos ter exportado muito milho, nós acreditamos em mais de 50 milhões de toneladas, e o preço vai atrair o comprador. Como o milho já caiu demais em reais, e pode cair um pouco mais com a pressão da safra, mais próximo do final do ano a tendência é o milho sofrer menos do que a soja”, disse o consultor em agronegócios, Ênio Fernandes, da Terra Agronegócios.

Ele complementa explicando que o custo de produção do milho é maior, ” já que soja gasta menos dinheiro do que o milho”, e quando se observa esse quadro versus elevadas produtividades no cereal, seu cenário é menos arriscado. É então que as oportunidades de se fazer hedge com o milho na B3 podem se mostrar bastante eficazes para a gestão do produtor brasileiro.

“Já na soja, a dificuldade é outra. Você pode travar o preço em Chicago, mas para travar o prêmio você fica dependente de uma trading. No milho, faço toda a operação de uma vez, ficando todo protegido. E neste cenário, eu acredito que o milho dê mais segurança ao produtor, desde que ele tenha alta produtividade. Em tempos de preços baixos, a grande ferramenta que você tem é a produtividade. Tudo vem do grão. Você tem que tirar o máximo do grão pelo hectare investido porque seu custo por unidade vai cair. Eu não consigo gestar risco se eu não tenho o grão”, disse o consultor.

Fonte: Notícias Agrícolas

 

 

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